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Monday, December 11, 2006

Será Portugal um país de penalistas, consultores de saúde e tipos que sem votar acabam no fundo por votar em alguma coisa?

A resposta à pergunta é obviamente que não, mas a Assembleia da República dominada pelo grande centrão rosa/laranja decidiu que sim, com o chamado referendo do aborto 2ª versão. Como resultado vamos ter direito a 3 meses de poluição visual e sonora de grupos radicais que se degladiam entre si, enquanto tentam demonstrar que têm mais razão que o outro. Esta poluição já começa a ser bastante visivel não só na televisão e rádio mas também para qualquer um que decida apenas sair à rua.

Eu sou contra o referendo do aborto porque julgo que é um exemplo de má politica, obviamente inconstitucional, cria um precedente perigoso no penalismo português e porque a legislação que define a existência de referendos e os regula é má democracia.

É má politica, pois a especificidade da politica de saúde pública e da política penal não se coaduna com referendos genéricos do tipo que vamos ter agora. As assimetrias de informação que existem entre o boletim de voto e a realidade individual e colectiva que enfrentamos são de tal forma gigantescas que tal coisa só poderá ser uma receita para o desastre. Aqueles que têm o poder para legislar nestas matérias não se podem descartar das suas obrigações, deixando a discussão política e as decisões incovenientes a cargo de grupos radicais com discursos exacerbados. É uma demissão do mandato legislativo que lhes é conferido no nosso regime republicano representativo.

O referendo ao aborto é obviamente inconstitucional pois o poder legislativo penal é da responsabilidade da Assembleia da República. Na realidade a lei penal é produzida por especialistas que redigem propostas, que são posteriormente discutidas na comissão da especialidade e depois negociadas e enviadas para o plenário para votação. Podendo o referendo ser vinculativo a única hipótese de pergunta seria concorda com o projecto lei nº... . Perguntarem-nos algo genérico do tipo, aceita a IVG até às 10 semanas, é pedirem uma carta branca para legislar o que lhes apetecer sem terem a responsabilidade da decisão. Imagine-mos que os deputados em comissão negoceiam uma alinea que diz que se as unhas dos pés da criança forem já visiveis então a lei não se aplica. Nós não votámos isto mas esta alinea fará parte da lei. Até que ponto é que esta pergunta pode ser vinculativa e não apenas um limite ténue a aspirações legislativas na assembleia, pois no final a lei será redigida e aprovada como usualmente acontece. Este referendo é uma autêntica trapalhada constitucional que torpedeia a competência exclusiva da Assembleia da República sem a torpedear, fazendo o mesmo em relação ao enquadramento constitucional dos referendos.

Este referendo cria um precedente no penalismo português pois leva a votos uma lei penal. Agora qualquer parte interessada pode outorgar a jurisprudência criada neste assunto para mudar qualquer lei penal desta forma. Podemos passar a ter referendos para elevar a pena máxima até à pena de morte. Referendos para votar a descriminalização do álcool quando se conduz. Todo o tipo de refendos que possamos imaginar. Estes referendos sobre politicas muito específicas são um contributo para a destruição das instituições democráticas e não para o seu fortalecimento como muitos defendem. Ainda recentemente um estado americano tentou votar a criminalização do aborto em qualquer situação incluindo a violação, o que sem dúvida é uma coisa muito bonita e humanista. Existem estados no sul dos EUA que aplicaram isso à lei fiscal, e não é preciso sermos uns génios para compreender que hoje em dia nenhum politico se arrisca a mexer nos impostos sem ir a referendo. Como resultado nunca mais se aumentaram impostos e estes estados são uns pedintes do governo federal em relação a investimentos na área da saúde e da educação. Um exemplo de como as assimetrias de informação micro-macro produzem equilibrios de Nash perfeitos mas ineficientes em termos de bem estar.

O enquadramento que regula os referendos em portugal é má democracia pois permite que se votem três hipóteses sendo que duas se repetem. Num referendo do tipo deseja alterar a lei ou não, não podem existir limites à capacidade vinculativa do referendo pois isso pode levar a que aconteça o que já uma vez aconteceu. Quem não foi votar ganhou e o que ganhou foi não se altera a proposta que é exactamente igual a votar não. A teoria da escolha pública ensina-nos que os resultados das votações são ordenados pelas preferências dos individuos e que a forma mais democrática de votar, é votar todas as propostas entre si, aprovando-se aquela que ganha todas as votações parciais. Assim podemos ter votações que no final sejam nulas, pois foi isso que as preferências revelaram. Chama-se a isto o teorema da impossibilidade de Arrow, que acontece sempre que as preferências não são transitivas entre si. Quando isto acontece o resultado da votação também não é óptimo mas esta é a forma de democracia mais próxima da perfeição que é conhecida pelo Homem. Pelo contrário os nossos referendos podem ser considerados das formas mais absurdas de democracia conhecidas pelo Homem, pois o resultado da votação pode revelar preferências do tipo eu até aprovo a questão mas prefiro ir passear para o Colombo em vez de me enfiar numa fila na mesa de voto. De forma a ultrapassar esta questão já apareceram algumas figuras proeminentes a defender que mesmo não sendo vinculativo o referendo, se o sim ganhar a Assembleia da República deve legislar nesse sentido. Parece-me a mim que a Constituição de tanto ser pisada não terá futuro nem como utensilio de trabalho para um arrumador de carros.

A questão das preferências individuais é também algo que apenas é manipulado com este tipo de referendos. O que poderemos esperar de um tipo que não gosta de água nem nada que se relacione com ela e que entre vários candidatos tem de escolher entre um que propõem a construção de uma piscina? O mais provável é que este individuo não vote nesse candidato. O que dizer então de alguém que não pode engravidar em relação à sua posição neste referendo? Não podemos dizer nada se não conhecermos as suas preferências indirectas em relação ao assunto. Podemos ter votações influenciadas por critérios partidários, do tipo penalização do Governo, posições religiosas baseadas em algum livro com mais de 500 anos e até podemos imaginar preferências mais absurdas. No final este referendo será decidido por essas preferências e não por aquelas que influem directamente na vida de um individuo, pela simples razão que apenas entre um quinto a um sexto dos eleitores pode engravidar. Os restantes simplesmente não podem pois não estão aptos para isso e como tal não sofrem directamente as consequências da sua decisão. Não sei onde está a democracia de votarmos coisas que apenas afectam terceiros.

Para terminar gostava de enumerar algumas das últimas revelações deste periodo de mau entretenimento que se avizinha (não bastava o prime-time na televisão pelos vistos). O DN na sua edição de hoje anuncia a existência de 7 movimentos pró e contra que, como de costume, nem legais são, pois não cumprem o requisito das 5000 assinaturas. Como se isto não bastasse o semanário Sol (na edição impressa) publicou um artigo que revela a inexistência de controlo financeiro em relação ao financiamento e gastos destes movimentos. Isto é sem dúvida muito democrático a promoção da opacidade dos movimentos politicos através do lapso juridico. Um convite para os homens com ambições politicas anunciarem convicções falsas para não perder votos e depois financiarem secretamente movimentos públicos que defendem as suas verdadeiras convicções. Também isto pelos vistos melhora a nossa democracia e a decisão política.

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